Folha.com | 14 de setembro de 2011 - 17:17

Clóvis Rossi: Nossos pobres são mais pobres

Os números sobre o aumento da pobreza nos Estados Unidos só demonstram a profundidade da crise pela qual passa o modelo contemporâneo de capitalismo, assentado no predomínio do sistema financeiro.

Aliás, Juan Somavia, diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho, braço da ONU, lançou um apelo nesta quarta-feira: "Chegou o momento de colocar a economia real no comando da economia mundial, com um sistema financeiro a serviço dela".

Detalhou: "Isso significa colocar os investimentos produtivos na economia real no centro da formulação de políticas, propiciar um ambiente adequado para as empresas sustentáveis e uma menor oferta de produtos financeiros arriscados e improdutivos", disse em discurso ao Parlamento Europeu. Poderia ter dito "basta de cassino".

De acordo, Somavia, mas duvido que seu apelo seja ouvido. A "pátria financeira" tem hoje o domínio da agenda global.

Mas voltemos à pobreza nos Estados Unidos. Os números, eloquentes por si só, ganham um significado ainda mais sombrio quando são comparados com um dos pilares do chamado sonho americano, qual seja o que de que os filhos teriam uma vida melhor do que a dos pais (na média, claro).

Se a pobreza só faz aumentar (há três anos consecutivos), desaparece essa segurança de horizontes.

Mas, atenção, não é porque o Brasil está conseguindo reduzir a pobreza há já bastante tempo que temos motivos para festejar.

Como bem mostraram a Folha-papel e a Folha.com, primeiro a porcentagem de pobres no Brasil é imensamente maior: 15% da população nos Estados Unidos é praticamente três vezes mais no Brasil (43% para ser preciso).

Pior: os pobres brasileiros são muito mais pobres que os pobres norte-americanos. Lá, é pobre quem ganha no máximo o equivalente a R$ 700. Aqui, R$ 140.

Nem adianta argumentar que o custo de vida lá é mais alto. Não é tão mais alto, não, de que dá prova o fato de que os brasileiros estão preferindo comprar imóveis em Miami porque são mais baratos do que no Rio ou em São Paulo.

OK, é justo reconhecer que os Estados Unidos têm uns 200 anos, pelo menos, de progresso econômico que acaba reduzindo a pobreza, ao passo que o Brasil, nesse período, foi uma imensa gangorra de sobes e desces na economia, para apenas nos 15 últimos anos, pouco mais ou menos, estabilizar-se, condição sine qua non para melhorar a vida das pessoas.

Mas, mesmo feita essa ressalva, não cabe complacência. Ainda mais que um dos grandes instrumentos para reduzir a pobreza, a educação, está em situação trágica no Brasil. Chega a ser humilhante verificar que um estudo da OCDE com 42 países colocou o Brasil no último lugar em estudantes universitários, na faixa etária de 25 a 34 anos. Só 12% dos jovens chegam à universidade.

Tudo somado, ainda falta um mundo para que o Brasil justifique de fato o rótulo de "emergente".